Apurações da Polícia Federal apontam que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) pode ter sido “instrumentalizada” para monitorar ilegalmente uma série de autoridades e pessoas envolvidas em investigações, além de desafetos do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
O uso indevido da Abin teria ocorrido quando o órgão era chefiado por Alexandre Ramagem (PL-RJ), aliado de Bolsonaro que, atualmente, é deputado federal. Ramagem foi alvo de uma operação da PF no dia 25 de Janeiro de 2024.
O crime, segundo as investigações, envolvia o uso do software “First Mile”, ferramenta de geolocalização que permite identificar as movimentações de pessoas por meio dos celulares delas.
Software espião
O FirstMile, desenvolvido pela empresa israelense Cognyte (ex-Verint), permite o monitoramento de até 10 mil celulares a cada 12 meses, bastando digitar o número da pessoa. Além disso, a aplicação cria históricos de deslocamento e alertas em tempo real da movimentação dos aparelhos cadastrados.
De acordo com as investigações, o sistema de geolocalização usado pela Abin é um software intrusivo na infraestrutura crítica de telefonia brasileira. A rede de telefonia teria sido invadida diversas vezes com a utilização do serviço adquirido com recursos públicos.
Procurada pela CNN à época, a Abin confirmou a compra do programa pelo governo federal e disse que o contrato, fechado em dezembro de 2018, pouco antes de Jair Bolsonaro assumir a Presidência, previa o uso da ferramenta até maio de 2021. Desde o fim do contrato, o FirstMile não estava mais em uso.
A ferramenta israelense solicita que seja digitado o número do contato e, a partir disso, é possível acompanhar em um mapa a localização do dono do aparelho, com as redes 2G, 3G e 4G.
O programa permite que seja rastreado o paradeiro de alguém com os dados que são transferidos do celular para torres de telecomunicações instaladas em diferentes regiões. Com essas informações, é possível ver o histórico de deslocamentos e criar alertas em tempo real de movimentações em diferentes endereços.
O uso do FirstMile é legal?
Especialistas ouvidos pela CNN em março, quando as primeiras denúncias foram feitas, explicaram que a Abin não é um órgão de investigação, mas que a aquisição e a utilização da ferramenta por si só não configuram um crime.
O especialista em direito digital Marcelo Crespo, coordenador do curso de Direito da ESPM, explicou que a função do órgão é monitorar fatos ou situações para fornecer subsídios ao presidente da República em assuntos de interesse nacional e segurança do Estado.
“Não é o cidadão em si que é monitorado, mas o fato ou situação”, falou. “Em tese, a Abin poderia fazer uso dessa ferramenta para monitorar ameaças internas ou externas à ordem constitucional.” Mesmo assim, o uso teria que ser pontual, com uma estratégia documentada e com o parecer da assessoria jurídica do órgão.
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Fonte: Metrópoles, Portal G1, CNN Brasil